domingo, 29 de dezembro de 2013

BOM DIA TOM WATTS * ANTONIO CABRAL FILHO - RJ

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BOM DIA TOM WATTS
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Hoje eu acordei
cumprimentando Tom Watts,
que um pouco mais que eu
empenha a vida inteira
na luta contra injustiças,
seja nos states
ou em qualquer outro lugar.

Ele, bem mais que eu,
sabe que Bertolt Brecht
morria pela dialética
e não temos nada contra
até porque nós dois
temos cá nossos modos
de também morrer pela dialética.

Aliás, ambos apoiamos
com o nosso melhor fervor
o direito inalienável
de cada um escolher
a morte que bem entender,
sobretudo os amigos do alheio.

Mas todos nós sabemos,
a sós ou na multidão,
que em termos de dialética
ela nos torna senhores
dos nossos sonhos e escolhas
e eu quase tanto quanto ele
exponho nossa bandeira:
NÓS LUTAMOS PELA VIDA!
*&*

sábado, 21 de dezembro de 2013

ADEUS REGINALDO ROSSI * ANTONIO CABRAL FILHO - RJ

ADEUS REGINALDO ROSSI
*
Ninguém imagina como
mas um dia eu
briguei com Reginaldo Rossi.
Foi uma briga feia,
rolou peixeira, empurra-empurra,
rabo-de-arraia até
a turma do deixa-disso se meter.
Eu já tinha bebido não sei quantas,
tava bem prá lá de Bagdá,
tinha acabado o cigarro
meu e do bar,
devia ser umas três da matina,
e o Reginaldo, dono do bar,
veio me dizer
que só tinha esse disco;
ninguém pescava por quê
só tocava "garçon"
na sua vitrola,
foi quando eu perdi a linha,
ameacei não pagar a conta
e levantei-me pra sair,
aí ele explicou-me
que o disco estava arranhado
e só escapara aquela faixa!
Mas o "próprio" acaba de partir...
E agora,como vou brigar
com o Reginaldo Rossi?
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terça-feira, 17 de dezembro de 2013

DA ARTE DE TORTURAR CRIANÇAS * ANTONIO CABRAL FILHO - RJ

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Dia desses eu atravessei a cidade, fui lá pros confins da zona oeste, na casa de um amigo, fechar uns textos que tínhamos de encaixar numas publicações. 
É que esse negócio de e-mail prá lá e-mail pra cá não funciona. 
Saltei do ônibus e lá estava ele no ponto encostado na sua Harley Davidson, de estimação. Engarupei-me e partimos pelo baixadão de Raíz da Serra. O desconforto era imenso. Não suporto andar de moto, inda mais na garupa. Ao chegar em sua casa, notei que estávamos tensos, fosse pelas responsabilidades ou pelo trajeto desagradável.
 Sem querer aporrinhar, pedi-lhe um copo d'água, e ele trouxe uma garrafa com dois copos e sentamos à mesa da sala. Ele pegou seu notebook, eu abri o meu e liguei e fomos corrigindo textos, acertando frases e períodos; plantando massetes aqui,  ali expressões jornalísticas, alguma gíria linguística, e, às vezes ríamos, porque sabemos que isso vai dar lenha; neguinho vai ter que ir ao "burronário" pra decifrar um pouco, pouco apenas, porque tudo não dá...Estamos matando à unha.
Suas crianças, três, um menino e duas meninas, se encastelaram na mesa; cada uma com seu  " ai...bolso!"; é claro que atrapalha. Ele já está irritado com elas, pois manda sair, ir para os seus quartos, para a varanda, para o quintal, mas elas repicam que "eu sou muito legal" e querem saber se eu vou contar história pra elas hoje. É tio Cabral pra lá e tio Cabral pra cá...Não tem jeito! Mas ele resolve pôr o menino de castigo; tem 4 anos, é muito esperto, "brinca" com um computador! 
Ele foi para o quarto chorando, prometendo que vai esperar para o Tio Cablal lhe contar história, o que asseguro fazer. Enquanto isso, eu e J, como vou apresentar meu colega, uma vez que se trata de gente real e não ficção, comparamos textos nossos com textos de Carlos Heitor Cony e Luiz  Fernando Veríssimo, procurando tirar uma casquinha nos papas da crônica. Mas eis que de repente começamos a ouvir uma voz tipo Mônica....mããe, a senhola qué mãe de Jesus, me adiuda, a senhola pode, é mãe de Jesuus, fala com meu pai pla eu blincar com mias ilmãs lá na valanda, diiii pla ele que noão agluento ficá pleso no esculo...vai! Eu olo pla senhola todo dia....
 Ao ouvir isso, J não aguentou e foi rápido para o quarto do menino, pegou-o nos braços e pediu desculpa, enquanto ele agradecia a Nossa Senhora dizendo " a senhola é lápida hein! Eu vou olá mais! Obligado!!" e beijou o pai, que caiu no pranto.
J, assim como eu, somos de raíz católica, temos nossos lares cheios de símbolos de nossa formação religiosa; Cristo na cruz, esculturas de igrejas barrocas, Santo Antonio, São Jorge, São Francisco de Assis e, impreterivelmente, imagens de Nossa Senhora pela casa toda. É o caso do quarto do menino dele, que ostenta um quadro da Virgem vindo de sua Avó, Dona Olinda, descendente de italianos franciscaníssimos. É aos pés Dela que ele reúne-se com esposa e filhos para orar ao fim dos seus dias. E é por isso que o pequeno P sabe se dirigir à Santa.
Mas, conclusão: Ele, como torturador, não faturaria nem um café!

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

COISA DO ROMA - CRÔNICA * ANTONIO CABRAL FILHO - RJ


Nós sabemos o que é isso, essas expressões que o povo cria, como "coisa do fulano, ah, cheira a sicrano, a "coisa do roma" se incorporou à vida do povo de Itapema. Mas quem vê o mar de Itapema, litoral norte de Santa Catarina, pensa em Itapoã - BA, Ipanema - RJ, tamanha a sua beleza, só não imagina que vai encontrar pelas ruas um deficiente heróico: O Roma!

Roma é como se apresenta o Senhor Francisco Carlos Roma. É pescador aposentado, e ninguém tomaria conhecimento da sua existência não fossem as suas aventuras sobre uma cadeira de rodas, motorizada.

O Roma, como dizem os habitantes do lugar, dá de cem no Felipe Massa! Ninguém entenderia como sem pesquisar um pouco sobre a sua "Cadeira de Rodas". Acontece que o nosso personagem, como todo bom pescador, desenvolveu habilidades especiais, após uma vida "inteira" consertando barcos de pesca, às vezes em alto mar.

Porém, em 2004, aos 24 anos, de tanto " dar uma " de engenheiro, sofreu uma descarga elétrica e o resultado foi a perca de um braço e as partes inferiores das duas pernas. Ou seja, invalidez aos vinte e quatro aninhos. Isso na cabeça de quem sempre desafiou os perigos, pode ser o fim!

Mas o Roma não é brinquedo não (!), diz o sorveteiro da praia, enquanto ele explica que graças a seus conhecimentos de engenharia mecânica, adaptou sua cadeira com um motor 125 cilindradas, pôs freio  e rodas de moto, e anda todo esse mundão de meu Deus em cima da "locomoção que eu fiz!"

Sua fala demonstra todo um elevado grau de auto-estima, auto-confiança, força interior, capaz de emocionar quem lhe ouve contar suas façanhas. E só isso explica as peripécias pela BR101, aonde foi filmado fazendo ultrapassagem em alta velocidade sobre cadeira de rodas.

Não ficou barato, exclama nosso herói, que detalha o "processo" que sofreu, a "prisão" da cadeira pela polícia e a reprimenda perante o juiz, de que se repetisse aquilo, ficaria sem o seu veículo!
Agora vejam-no sobre rodas:
* - ACF é escritor e poeta, morador de Jacarepaguá e editor do blog letrastaquarenses.blogspot.com.br  
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quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

SOBRA DE RAZÕES * ANTONIO CABRAL FILHO - RJ

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Quisera ser guerrilheiro
dias e noites selva adentro
montes e vales regados a suor
 comida por prêmio
 água por descoberta
 sono por conquista
da meta atingida
tudo para mudar o mundo
com as massas de arma em punho
como quis Chê Guevara
ser odiado pelos imperialistas
e os sanguessugas de plantão
procurado como agulha no palheiro
por idiotas armados até aos dentes

E no entanto olha eu aqui
sentado com o político mais corrupto
da minha pobre cidade
solicitando coleta de lixo
para as ruas do meu bairro
como um reformista manso
em nome dessa gente indefesa

Mais um dia e eu ainda
sigo Malatesta
arranco o pino da granada
latente em meu peito
junto com Bakunin
e perco essa paciência de Jó
mesmo que ninguém 
entenda o meu gesto Artaud
e pense que eu mandei pros ares
a câmara cheinha de vereadores
simplesmente porque andei lendo demais
batendo papo com Leminski
ouvindo Violeta Parra
na madrugada sem sono
falando sozinho na cozinha
enquanto a família dorme sossegada
ou coisa assim...
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